O Gramofone é um dispositivo musical que decodifica e reproduz sons por meio de um disco plano. Foi criado em 1887 pelo alemão Emil Berliner, que emigrou para os Estados Unidos em 1870. Depois disso, as gravações para o gramofone se tornaram a principal mídia usada para fins comerciais, fato que concorreu para o seu acentuado consumo no início do século XX, potencializando a indústria cultural, arrefecida somente nos fins dos anos de 1920 após a Primeira Guerra Mundial. Uma das principais criações da mídia mecânica é também relacionada com a caixa de música devido a sua base ser constituída de uma caixa, cuja variedade de estilos pode ser observada em fotografias de jornais e revistas. De sóbrios aos rebuscados, os gramofones servem de inspiração ao universo feminino quando associados a porta joias, mas também quando se constata sua relação com gravações de canções, especialmente por mulheres.
Sua criação indica para uma revolução cultural incluindo a música. Simboliza a vida moderna, mudança de costumes bem como modos de sociabilidade. Para Silva (2015, p. 251), “ouvir música sempre foi, desde os primórdios da humanidade, uma atividade essencialmente coletiva; indivíduos que ocupam um mesmo ambiente onde se tenha a música sendo executada compartilham dessa experiência essencialmente acústica que é a arte musical.” Com a reprodução fonográfica como o gramofone, ouvir música se tornou algo a ser feito individualmente, ou quando coletivamente, sem a necessidade de intérprete. Figura esta, que se tornou virtualizada, uma vez que a presença ao vivo de alguém tocando passou a ser dispensável devido à possibilidade de se ouvirem os sons previamente gravados através de um aparelho que é capaz de reproduzi-los.
Segundo Souza (2001), para Tinhorão Jornalista e crítico musical nos anos 60, historiador da cultura brasileira, a passagem de dependência do capital inglês para o norte-americano na República provocou profundas mudanças culturais no Brasil. A música popular deixou de ser consumida pela classe média urbana sob a ótica da modernidade, aproximando-se dos modelos culturais europeus e norte-americanos. O que favoreceu “a dominação do mercado brasileiro pelas músicas importadas desses grandes centros. Entretanto, devido aos altos preços das novas técnicas de divulgação musical (discos, cilindros e aparelhos de gramofone), os novos gêneros não chegam a atingir as camadas populares” (SOUZA, 2001, p. 301).
Em amplo sentido, como parte da cultura material, o gramofone possibilita falar de educação de sensibilidades, já que a música educa os sentidos, principalmente porque mobiliza sentimentos, desejos, emoções e afetos de maneira individual. Estabelece, como refere Taborda de Oliveira (2020), mediações que fazemos entre o mundo interior e o exterior. Faz-nos estabelecer diálogo com quem canta, nos tornar um pouco do que somos pela voz dos outros, particularmente no caso das canções gravadas em disco e ouvidas por meio de gramofone.
Segundo Mares Filho (apud KOYAMA E BUENO, 2013), no início do século XX, o gramofone e discos sonoros foram, entre outros objetos, localizados no museu do Instituto de Educação Caetano de Campos (IECC), num Quadro para Educação Intuitiva, para serem usados em diferentes disciplinas. Além disso, com base nesse autor, a expressão ‘Educação dos Sentidos’ “foi frequente nos textos de intelectuais, políticos e educadores em toda a primeira década do século XX” (Id., 2013, p. 8), compondo, portanto, a cultura material escolar.
Um dos modos de se referir sobre o gramofone no seio familiar é descrito por Carlos Drummond de Andrade no poema “Família”, o qual relata a ambiência cotidiana de classe média feliz e esperançosa, a mulher que faz tudo, e como todos, ouve a voz rouca desse aparelho.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Família. Alguma Poesia. https://www.nossapoesia.com/poema/familia-carlos-drummond-de-andrade/ Acesso em 07/03/2022
GRAMOFONE. In: Infopédia. . Porto: Porto Editora, 2003-2009. Disponível na www:<URL: http://www.infopedia.pt/$gramofone>.) Acesso em 05/03/2022
KOYAMA, Adriana Carvalho; BUENO, João Batista Gonçalves Educação dos sentidos e das sensibilidades: olhares entrecruzados sobre artefatos de ensino na contemporaneidade. ANAIS. XXVII Simpósio Nacional de História, ANPUH: conhecimento histórico e diálogo social. Natal/ Rio Grande do Norte, 2013.
SILVA, Rafael Alexandre da. Do gramofone ao live streaming: a evolução dos modos de escutar música - algumas implicações. Rev. Tulha, Ribeirão Preto, v. I, n. 1, p. 251-263, jan.-jun. 2015, P. 251-263
SOUZA, Miliandre Garcia de. História Social da Música Popular Brasileira. História: Questões & Debates, Curitiba, n. 34, p. 299-303, 2001. Editora da UFPR, p. 229-303
TABORDA De OLIVEIRA, Marcus. Pesquisas Sobre a Educação dos Sentidos e das Sensibilidades na História da Educação: algumas indicações teórico metodológicas. Revista História da Educação (Online), 2020, v. 24, p. 1-32