A poluição causada pelas fábricas e residências na Inglaterra durante o século XIX era tão intensa, que, segundo Hanlon (2015. p. 4), foi uma das principais causas de mortalidade da época, principalmente nas áreas urbanas da Inglaterra, chegando a ser considerada “um traço característico das cidades inglesas no século XIX”. (HANLON, 2015. p. 4) Charles Dickens descreve em seu livro “A Casa Soturna”, escrito em 1853, que as fumaças que desciam das chaminés em Londres formavam “uma garoa leve e escura, com flocos de fuligem, tão grandes como fornidos capulhos de neve.” (DICKENS, 1986. p.1)
Além da poluição, outras consequências da industrialização na Inglaterra foram o aumento no poder aquisitivo e, consequentemente, do consumo observado nas classes operárias ao longo do século XIX e também a intensificação da rotina de trabalho doméstico. Relatos autobiográficos da classe trabalhadora da época, reunidos no livro “Bread Winner: an Intimate History of the Victorian Economy” (GRIFFIN, 2020), indicam o quanto a rotina de trabalho doméstico estava inserida no cotidiano e nas memórias formativas dessas pessoas. Griffin (2020. p. 253) aponta que a rotina de arrumação e limpeza da casa era uma temática que funcionava em muitos casos como ponto de partida para as pessoas organizarem e compreenderem suas experiências da infância. O espanador era um dos itens utilizados para remover a poeira que constantemente se acumulava nas superfícies e objetos dessas casas.
Maria Cecília Homem chamou de “culto da mercadoria” o aumento no consumo de objetos, que também foi observado no Brasil durante a segunda metade do século XIX. Aqueles com maior poder aquisitivo viajavam para a Europa e retornavam com diversos artefatos. Após a libertação das pessoas escravizadas, houve uma redistribuição das tarefas domésticas e, nas famílias com melhores condições financeiras, isso representou a incorporação de artefatos como espanadores, moedores, batedeiras, entre outros. (SCARPELINE, 2019. p. 236-239)
Outro indicativo de que, no Brasil, tais artefatos foram incorporados mais tardiamente é visto na obra “Um diário imperial: Leopoldina”, de Gloria Kaiser, em que a casa da Família Real é descrita como muito simples e pouco equipada: “a casa [...] é equipada com muita simplicidade. Quase não há móveis nem louças finas; falta quase tudo.” (KAISER, 2005. p. 70)
Adeline Sergeant (1851-1904) foi uma escritora inglesa da segunda metade do século XIX. Foi educada em casa por sua mãe até os treze anos. Aos quinze, publicou sua primeira coleção de poemas. Segundo Stephen e Lee (1912, p. 291), as obras de maior sucesso da autora eram as que retratavam o lar provinciano da classe média não-conformista, entre elas seu livro Esther Denison, publicado em 1889. Nele, a autora escreve: “Sra. Neave era uma senhora rabugenta, com uma voz repreendedora. Sua ocupação consistia, aparentemente, em correr pela casa com um espanador na mão.” (SERGEANT, 1889. p.48)
Anna Maria’s House-Keeping (POWER, 1884) é um livro com dicas para otimizar o trabalho doméstico, publicado em 1884 em Boston. Escrito em segunda pessoa, de modo a simular uma conversa entre a autora e a dona de casa “Anna Maria”, uma representação da leitora. Neste livro, a autora se refere ao trabalho doméstico como uma prática que deve ser treinada e aperfeiçoada:
“Então deixe-me dizer-lhe, Anna Maria, que nunca é cedo demais para começar [a desenvolver] [...] a prática da limpeza [...]. Você deve decidir assumir a responsabilidade do trabalho e aprender o que é ser a potência por trás de toda a máquina doméstica.” (p. 22-23)
O livro traz dicas sobre todo tipo de trabalho doméstico, como “não pense que basta passar o espanador para deixar as coisas limpas. A poeira voa e se acumula em outro lugar” (p. 243-244). Além disso, a autora também apresenta recomendações de como e onde guardar as ferramentas de limpeza, de forma a otimizar a realização das tarefas: “É um alívio encontrar a vassoura e a pá sempre juntas, e o espanador à mão” (p. 93).
DICKENS, C. A Casa Soturna. Trad. Oscar Mendes. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
GRIFFIN, E. Bread Winner: an Intimate History of the Victorian Economy. New Haven: Yale University Press, 2020.
HANLON, W. Walker. . Pollution and Mortality in the 19th Century. National Bureau of Economic Research, 2015.
KAISER, G. Um diário imperial: Leopoldina, Princesa da Áustria, Imperatriz do Brasil, de 1º de dezembro de 1814 a 5 de novembro de 1817. Trad. Anna Olga de Barros Barreto. Rio de Janeiro: Reler, 2005.
POWER, S.D. Anna Maria’s House-Keeping. Boston: D. Lothrop and Co., 1884. Disponível em https://hdl.handle.net/2027/coo1.ark:/13960/t3805nx0z Acesso em 19 de março de 2022
SCARPELINE, R. Arte doméstica e decorativa no universo rural paulista: inventário e preservação. Tese (Doutorado em História) – Universidade Estadual de Campinas. Campinas, p. 236-239. 2019.
SERGEANT, E. F. Adeline. Esther Denison. Londres: Richard Bentley & Son, 1889. p.48. Disponível em https://hdl.handle.net/2027/uc1.a0001213693 Acesso em 19 de março de 2022
STEPHEN, L.; LEE, S. (Ed.). Dictionary of national biography. 2. ed. Smith, Elder & Company, 1912. v. 3, p.291. Disponível em https://archive.org/details/dictionaryofnati23lees/page/290/mode/2up Acesso em 18 de março de 2022.